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  • Ramon Cavalcante Trauczynski

Os impactos das mudanças regulatórias promovidas no aeroporto do Rio de Janeiro –Santos Dumont.


Mudanças regulatórias sempre acompanharão consequências para o setor regulado.


Talvez o exemplo mais recente dessa afirmativa esteja presente no setor aeroportuário, mais especificadamente nas mudanças que inserem restrições de voos no Aeroporto Santos Dumont, na cidade do Rio de Janeiro.


O Aeroporto em questão contou com duas mudanças drásticas em sua operação no ano de 2023.


A primeira delas partiu do Poder Executivo federal, que determinou uma limitação de capacidade do aeroporto, considerando os níveis históricos de demanda entre os anos de 2011 e 2019.


Assim, o Aeroporto que atualmente possui uma capacidade declarada de quase 22 milhões de usuários, passou a ter uma restrição para 10 milhões de usuários ao ano.


Referida medida já demonstra seus resultados, especialmente a partir do mês de outubro, em que se operará uma gradativa redução de voos haja vista a proximidade do teto estabelecido, inclusive com remarcação de passagens já agendadas.


Em segundo plano, há uma medida ainda mais drástica. Trata-se daquela veiculada através da Resolução CONAC-MPOR nº 1, de 10 de agosto de 2023.


Em linhas gerais, referida resolução estabelece que, a partir de 02 de janeiro de 2024, o Aeroporto do Rio de Janeiro – Santos Dumont só poderá contar com voos cujo aeroporto de origem ou destino esteja em um raio de 400km, e opere apenas voos domésticos.


Em termos práticos, o único aeroporto que atende aos requisitos estabelecidos é o Aeroporto de Congonhas, da cidade de São Paulo.


Não há dúvidas quanto ao impacto da medida. O Aeroporto Santos Dumont, situado na cidade mais visitada do Brasil, possui uma estimativa de fluxo com recebimento de 12 (doze) milhões de passageiros ao ano.


Há uma notória preferência pelos passageiros e companhias aéreas com relação ao Santos Dumont, por questões de localização geográfica, em detrimento do outro Aeroporto da capital fluminense: o Aeroporto Internacional Tom Jobim, popularmente conhecido como Galeão.


Vale dizer que a preferência experenciada é decorrente de uma dinâmica de mercado, que coaduna com uma tendência do setor aeroportuária de incentivo a concorrência e menor interferência estatal.


Dá-se especial destaque à Lei nº 14.368/2022, denominada “Lei do Voo Simples”, que busca a desburocratização do setor de aviação civil brasileiro, ampliando seu dinamismo e competição.


Além disso, há a Lei nº 13.874/2019, denominada de Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, que estabelece em seu art. 5º que proposições da administração pública federal que venham afetar interesse geral de agentes econômicos ou usuários de serviços sejam precedidas da denominada Análise de Impacto Regulatório – AIR.


As mudanças mais drásticas anunciadas pelo CONAC, no entanto, têm uma expectativa inicial de reduzir o fluxo de passageiros do Santos Dumont para cerca de 7 (sete) milhões de passageiros ao ano, levando a quase metade do número atualmente adotado.


A justificativa trazida na Resolução da CONAC é a de necessidade de diminuição do fluxo de passageiros para a realização de obras no Aeroporto, a fim de implementar mecanismos de proteção de voos.


No entanto, a medida coincide com diversas manifestações já proferidas pelo Prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, além do Governador do Estado, Cláudio Castro, que miram a diminuição do fluxo de passageiros do Santos Dumont, no intuito de compensar o déficit apresentado pelo Galeão.


As expectativas de fluxo destinadas ao Galeão, desde a realização de sua Concessão, não foram correspondidas. Uma série de fatores levou a esse cenário, como a pandemia vivenciada, além de um fluxo menor do que o pretendido ao decorrer dos anos, cuja origem não exclui os aspectos concorrenciais.


Na visão dos gestores públicos locais, uma “compensação” de fluxos seria interessante, no intuito de “equilibrar” o número de passageiros entre os dois aeroportos, uma vez que um estaria deficitário e outro superavitário, ainda que operantes na mesma região.


Referido cenário dá todos os indícios de que a Resolução que restringe voos no Santos Dumont foi apenas uma espécie de “formatação jurídica” para instrumentalizar as pretensões políticas externalizadas, de equilíbrio entre Santos Dumont e Galeão, e que já haviam sido adotadas pelo Governo Federal quando da limitação na capacidade do aeroporto.


É nessa linha, portanto, que há notórios indícios de que a fundamentação para a limitação de origens e destinos de voos do Santos Dumont tem motivação diversa daquela indicada em Resolução.


Ocorre que uma medida dessa espécie almeja estudos de impacto pormenorizados, haja vista que tratam de um dos principais aeroportos do Brasil, afetando, portanto, toda uma gama de aeroportos, empresas aéreas e os consumidores, ao fim de tudo.


De maneira mais específica, deveria ser vislumbrado a AIR, indicada pela Declaração de Direitos da Liberdade Econômica.


Não é o que se vê do panorama, que reduzirá de maneira abrupta o fluxo de um dos principais aeroportos do Brasil, no intuito de uma compensação artificial para outro aeroporto em específico.


Referida redução tem o condão de impactar não apenas o Santos Dumont, mas também outras praças de aviação que compõem a malha, além de invariavelmente impactar os usuários finais, com possíveis maiores preços de passagens pela necessidade de adaptação das empresas aéreas.


Referidos impactos já estão sendo visualizados, com a provável necessidade de reagendamento de voos pelas companhias pelos próximos meses, em vista da proximidade do teto de usuários estabelecido pelo Governo Federal na primeira medida anunciada em junho.


Para além disso, o Aeroporto Santos Dumont é o único Aeroporto que resta sob gestão da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária – INFRAERO, após anos de concessões promovidas pela Empresa para outros Aeroportos que eram de sua gestão.


Nesse panorama, a Empresa Pública terá uma redução de arrecadação considerável, pela diminuição do número de passageiros.


Somando todos esses fatores, o Prefeito de Guarulhos/SP promoveu denúncia ao Tribunal de Contas da União – TCU contra a Resolução nº 01/2023 do CONAC, suscitando a ilegalidade na medida de restrição de destinos e origens ao Santos Dumont.


Em relatório da Auditoria de Rodovias e Aviação do TCU há concordância com o apontamento de graves indícios de ilegalidade nas mudanças. Além disso, o relatório apura os prejuízos que serão daí ocasionados.


Apenas em receitas tarifárias, estima-se que a Infraero terá um prejuízo de cerca de R$ 400 milhões anuais.


Além disso, indica-se que não apenas o Aeroporto Santo Dumont poderá ser impactado em suas receitas, mas também outros. Por exemplo, há uma estimativa de que Guarulhos, maior aeroporto do país, contará com uma redução de 7% de sua demanda a partir das medidas adotadas pelo Governo, além de dezenas de outros aeroportos.


Para todos os aeroportos impactados com a redução de fluxo, há ainda a grande chance de que os agentes privados que exploram os espaços dos Aeroportos venham a promover pedidos de reequilíbrio econômico-financeiro, gerando ainda mais prejuízos a INFRAERO.


Diante das diversas críticas que a medida obteve, além da sinalização de ilegalidade indicada pela Auditoria do TCU, o Governo Federal tem sinalizado para a aprovação de uma nova gama de regulamentações para o Santos Dumont, no intuito de mitigar esses prejuízos. Inclusive, o Governo Federal indicou um novo Ministro para a pasta de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, que recentemente deu expectativas de indicar novas dinâmicas para o Aeroporto Santos Dumont do que as duramente criticadas até o momento.

Fato é, no entanto, que as mudanças abruptas promovidas pelo Governo Federal no Aeroporto Santos Dumont – adotadas em grande parte por pressão regional – demonstram nitidamente que as mudanças regulatórias devem ser estritamente analisadas antes de sua promoção, com a oitiva de todos os agentes eventualmente impactados, com a devida Análise de Impacto Regulatório – AIR.


O ambiente concorrencial construído ao longo dos anos não mais comporta decisões “soberanas”, que não avaliem estritamente os reflexos que ocasionam. Há uma necessidade de previsibilidade para o futuro no ambiente regulatório, em que as decisões não se pautem em animosidades, mas sim em estudos técnicos e pormenorizados.



Ramon Cavalcante Trauczynski

Advogado, Infraestrutura & Regulatório


*Advogado. Especialista em Licitações e Contratos Administrativos pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR).


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